Aceitação

Daqui o reflexo parece-me bom. Seguro, bonito, convidativo até. Eu quase confio nele, eu quero fazê-lo. A paisagem é chamativa, colorida, cheia dos artifícios de beleza que a gente procura por todo canto. E Deus, nós sabemos o quanto eu preciso dos tons vibrantes, dos contrastes que lembram-me da vida em que estou. Mas eu não posso sair, não posso deixá-los. Eu os amo, sim. Amo-os de maneira fria, seca, incondicional. Não declaro-me por orgulho, não demonstro por nada além do medo mais banal; mas a gente sabe do ar que eles me dão, do chão. Do sangue pulsante no coração que não permite-me cair. Eles, os sonhos-- ah, eles são tudo para mim. Tudo que eu tenho, peço e suplico, preciso e jamais largarei. O vento, o tempo traz consigo muito suor, ardor e vontade, gosto novo que faz-nos enlouquecer. E isso é sim maravilhoso; renegá-los jamais trará-me minha paz. E o equilíbrio é constante, quase perdido. Inexistente para o olho nu, posso garantir. A cor daqui e de lá, do ilusório vivaz, ah, elas jamais serão as mesmas. Mesmo tom, sensação e acolhimento podem ter, mas jamais mesmo nome. Vamos eternamente sobrestimar o título que damos ao que nos faz bem. O irreal, ah, ele é tudo. Para todo mundo, admitamos. O sabor, o arrepio, a visão: sem ele, seríamos nada além de peças jogadas, largadas num tabuleiro preto-e-branco. E eu não quero isso, não. Eu quero o insano, a fagulha, a perdição. Quero o mínimo que o mundo extraí de mim e obriga-me a sentir nesse chão, quero as notas pro imaginário agradecendo-o pela palheta de tons, de amores que me deu. Seja lá qual for o fim, eu escolho me render, render a toda a loucura e inconsequência, ao final premeditado de querer-lhe de todas as maneiras e jamais tocar-lhe, possuir-lhe por inteiro. Eu escolho acreditar, mesmo que isso não leve-nos a nada. O sonho nos mata e dá vida, esconde-nos e força-nos a sair e encontrar-lhe nos cantos em que se manifesta, brinca conosco. Que nosso jogo jamais chegue ao fim, por favor; deixe-nos correr e amar, encontrar seja lá o que a sorte jogar em nosso caminho.

Letícia Castor
Enviado por Letícia Castor em 12/11/2014
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