Convite

Eu preciso tanto me livrar de tudo isso. Todo esse peso, essa bagagem vazia que eu insisto em entulhar com coisas inúteis, lembranças, semi-vontades de ontem, gostos que já nem lembro mais do nome. Preciso jogar tudo isso para o alto, preciso dum novo lugar para repouso, doutras verdades e desejos, outras peles, outras carnes que mostrem-me que existe calor fora daqui. Fora do paraíso e do inferno que é ver toda essa gente dando passo largado, fora da ambição do que quero e preciso ser, fora da absoluta necessidade de nomear-me como algo. Quero ser o que o momento oferecer-me e nada mais. A beleza do passado é inerente, é inegável, sim-- mas agora ela tornou-se apenas mais um ópio, uma corrente em meus tornozelos, uma venda em meus olhos. Mostre-me o que tu tiveres consigo nesse instante, dê-me o que tiveres em tuas mãos: se teu amor é falho, eu não me importo, ele é real. O sonho só me embriaga, compadece, exila nesse canto escondido de tudo que possa me reviver. O sonho velho, pelo menos. Eu quero esse horizonte, esse quadro em branco com uma gama infinita de cores para eu jogar por todos os lados. Eu amo tê-lo aqui, mas se já fugiras, eu preciso correr também. Não apenas por ti, mas pelo meu fôlego, meu suspiro que te quis e saboreou, que jamais deixará-te ir de uma vez. Terei todos os gostos do mundo, e tu serás mais um recorte bonito, um retalho de tudo que já me compôs. Se tu podes, fica, digo-lhe mais nada. Anda, escapa ao meu lado, mas caso contrário, deixa eu lembrar do teu deleite e homenageá-lo nas bocas, nos cantos alheios cheios de beleza desse monte de gente.

Letícia Castor
Enviado por Letícia Castor em 07/12/2014
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