Vitória

Que loucura. Meu Deus, que aberração. Que coisa mais insana de se pensar, de fazer-me visualizar nessas paredes tão estreitas da minha cabeça. Olha só, olha isso: aonde raios eu queria chegar, para começo de conversa? Tenho mais nem ideia. Tenho só é gratidão. Olha isso, olha esse espaço; esse cenário todo louco, disforme, colorido, sem nome-- fui em quem decorou isso tudo? Não pode ser. E quanto ao meu medo? Meus grilos, receios carcomidos, pele de veludo e porcelana, brilhante e reluzente que só se escondia das feridas que ameaçavam-lhe de longe. Ela destruí-se por completo; atirou-se na lama, nas facas, nos espinhos. Sangrou e assim, somente assim, derramou toda sua beleza por todo canto deste chão. Beleza que alcançou a tantos, alcançou você. Achou-te assim também, de repente. Na surdida caminhara e, um segundo que dei de piscar e olhar ao redor, tu cruzou meu passo. Vê se pode, eu nem tentei te segurar. Eu satisfazia-me em olhar-te de longe, imaginar apenas qual seria teu gosto. Mas tu veio e dilacerou-me assim, sem nem pedir permissão. Deu-me a ruína e a salvação, a vontade em sua maldade, malícia corrompida que mostrou-me a humanidade que tanto precisava. Então pode ir, pode voltar, pode correr e fazer sofrer com nada além da lembrança do teu sorriso, faça o que quiseres: tenho aqui nada além da incredulidade, do êxtase impossível de exaurir-se de mim. Amei todo esse reflexo e seus adornos, preciso de mais nada. Eu abracei a insanidade em mim e deixei-a florescer. Tu foras apenas consequência-- a mais linda e devastadora de todas elas, eu sei. E de ti e tua herança eu jamais irei abrir mão.

Letícia Castor
Enviado por Letícia Castor em 15/12/2014
Reeditado em 19/12/2014
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