Sobre amores platônicos

Sempre ouço falar sobre os diversos tipos de amor e, com eles, as diversas dores que sempre os acompanham; amores destroem-nos. Todo tipo de corrosão, de devoção, de perdição. As pessoas deserdam-se, perdem-se, doam-se todas as maneiras pela promessa que ele traz. É mais uma visão do que algo tangível, e por isso, cada passo em seu caminho é mais um para o precipício que já sabemos que iremos alcançar.

Mas não era disso que eu vim falar, não. Vim falar do que sinto, do que conheço. Quem quer mais uma história de um caso de paixão exaurida? Desses já nos cansamos faz tempo; eu quero é exaltar a beleza, a tragédia que é amar sem retorno. É o pior tipo, digo com confiança. Tudo bem, talvez cada uma doa de sua maneira indescritível, eu sei. Mas o platônico, ah, esse é assassino, e dos mais cruéis. Ele não pede permissão mas tem o seu consentimento logo de cara; um olhar, um passo, uma palavra e pronto, eis o seu fim-- já está à mercê de algo que mal o enxerga em seu horizonte.

Você quer um espaço no dia dum desconhecido. Você quer ser sombra noutra parede, outro cômodo, outra vida. Quer migalha, gotas d'água, o que for preciso para não deixar algo morrer. Esse algo vive de uma maneira absurda dentro de você, ela explode-- é um universo de cores, de sonho, de vontades. É uma colisão de mentiras insanas e intoxicantes que colocam-te no encalço de algo que sabemos que nunca iremos possuir. É pela fantasia que vivemos e por ela que morremos, pela beleza e a ardência na pele sempre exposta a tudo o que o vento cortante trouxer.

Fortaleza todo mundo é; cada um é feito castelo, muro, muralha. E olha só, de repente viramos é castelo de areia. Tudo que se constrói, estrutura, se orgulha num momento só vira pó. A gente escolhe ser receptáculo duma cerne que nem nossa é; a gente pega qualquer carga para não deixá-los caírem no chão.

E queremos seu melhor, essa é a parte mais irônica. A gente quer o seu amor mesmo que não sejamos quem o receba. Quer teu sorriso e teu gozo extasiante, teu toque e certeza de que o dia trouxe-lhe mais razão para continuar por aqui. Nem que de longe só para admirarmos, só para sonharmos mais um pouco o quão maravilhoso tudo poderia ser. Mas não é, essa é a síndrome: se formos amados de volta, cadê a aventura de sustentar essa melancolia toda? Plenitude é luxo, é utópica demais.

Letícia Castor
Enviado por Letícia Castor em 15/03/2015
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