Narrativa da decadência humana - Ato I - Do auge às cinzas

Não tenho mais palavras que não se encaixam nos padrões de cliché. 

Talvez eu esteja tentando fazer um ritual para tentar entrar no espírito da coisa. Talvez eu queira alcançar o objetivo puro e destilado. Talvez eu precise abstrair e ser simplificado ao menos uma vez.

Eu sei que ninguém se importa com os sentimentos dos outros. Isso não é mais uma coisa comum, se é que existiu em outras épocas que não me recordo por ser jovem demais. 

No fundo, eu só queria ter alguém para deitar no peito, ouvir o coração dela, dormir com ela, eu ser dela e ela minha. Mas ninguém gosta de pessoas complexas.

Ninguém gosta de pessoas que não tem auto controle de sua vida. Ninguém gosta de pessoas desregrada, rebeldes, cabeça erguida demais.

Do que adianta ser bonito e ter uma cabeça tão feia? Tão desorganizada? Tão cheia de coisas que transbordam através da boca, através dos olhos.

Eu queria ter uma identidade. Eu queria ser diferente em alguma coisa. Eu quero ser o inovador. Eu queria ser o que apaixona as pessoas com seu sorriso bobo e não por manipulação. Eu queria ser a pessoa que as pessoas sentem prazer em estar perto, de conversar.

Eu queria ser diferente.

Eu queria ser o que acho que sou eu.

Mas, sou tão dispersivo. Sou tão incompetente. Não consigo nem passar de ano na escola por ficar pensando em trabalho.

Aliás, é o que me sustenta. Trabalhar.

Passar todos os dias cerca de quatro horas calado. Imaginando como deve ser a vida daqueles clientes de belos sobrenomes, com endereços onde ficam belas casas.

Só eu e pessoas que nunca saberão quem sou. Que sei tanto sobre a vida dela.

Hoje, sou difícil de lidar, de entender, de conversar, mesmo que nada seja oficial, mesmo que nada me cobre, as expectativas me cobram.

Devia ser lindo meu jeito bobo de um ou dois anos atrás. Um sorriso fácil. Frustrações não existiam.

Ninguém havia me dito ainda quee amava. Mas chegou o dia que me disseram. E apesar de ser diferente, tentei me transmutar e ser o que ele queria que eu fosse. Fui o que ele queria que fosse. 

Tão logo alcancei que ele me descartou. Havia "alguém melhor que eu". Tentei superar. Estou quase lá.

Tentei novamente mais tarde.

Foi bonito. Foi exatamente como um filme. Mas eu precisava mudar, precisava entrar nos moldes dele. Assim fiz. Mudei, alcancei o que ele procurava. 

Então, ele foi embora. Eu "era inconstante" por ter mudado por ele.

Outros vieram e foram. Vieram, recostaram e se foram.

Por um motivo, um único motivo, por ter me transformado tantas vezes, por ter me entregado intensamente, gastei todas as minhas vidas.

Numa tentativa de não beirar à loucura, ao fanatismo, à possessão e o ciúme, vi uma solução natural que não escolhi exatamente ser aquilo pra mim. 

Aquilo foi como o caixão de Osíris entregue por Seti: me coube perfeitamente. 

Minha última chance era me trancar dentro do labirinto que estava minha vida, caminhar por belas estradas da imaginação, sonhar tão alto que me fazia chorar ao acordar, me afundar na minha loucura, na solidão, no abandono, no total negativismo. 

Até ontem à noite eu sonhava ter alguém, outro louco que me deitasse no seu colo e me dissesse que eu não posso desistir. Que há alguém que acredita em mim. Que está disposto me tirar do armário do meu individualismo doentio. 

Eu sonhava ter alguém assim. Eu acordei.

Estou desperto!

Estou disposto a viver minha última experiência homoafetiva. 

É dramático mas eu me conheço.

Eu nunca vou ser o modelo paulista de ficante ou namorado. Eu só vou ser mais um que ele conheceu.

E não sinto tristeza por isso. 

"Mudanças realmente acontece quando você sai da sua área de conforto", L. Andrade

Diego B Fernandes Dutra
Enviado por Diego B Fernandes Dutra em 30/12/2015
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