Bilhetes de Verônica (11)

- Não sei o que lhe aflige; seja o que for: você é mais importante!
 
     Vinha triste. Triste demais! Seguia como se dançasse em ciranda: ondas que vibravam da angústia agressiva à depressão desmedida. E quando mergulhamos neste turbilhão de sentimentos que parecem ter força superior à vontade, não enxergamos como escapar à correnteza, ainda que a boia de socorro flutue ao alcance de nossos braços, requerendo apenas que os estendamos na direção certa! Minha amiga viu-se lançada por inteiro nessas águas turbulentas. Por mágoa, desilusão ou desamor, experimentava todos os humores do afogamento. Desejaria matar: aos que a empurraram, quando caminhava tranquila pelas margens; ou a si própria, por não ter aprendido a nadar em tempo.
 
     Não lhe conheço a aflição. Aliás, há searas onde tateamos no escuro, todavia, nenhuma se mostra mais obscura do que avaliar a dor que não nos pertence.

- Verônica, deixe-me tocar sua mão.
 
     Tomávamos café juntos. Depositei-a contra o tampo da mesa sobre a qual se espalhavam as xícaras, os biscoitos e a nossa conversa. Senti uma suave pressão, resultado do contato dos dedos de João que, naquele instante, ministrava-me uma das mais interessantes aulas de Filosofia.

- O que lhe parece?
- Sinto seus dedos me tocarem com delicadeza...
- Porque, para você, é uma carícia. Outros pensariam ser um tapa! Ou algo pior!
 
     Este bilhete obedeceu à modernidade: enviei-o pelos meios virtuais. Não contemplei os olhos que leram o recado. Queria que percebessem o quanto temperamos com nossos medos os sofrimentos que nos atingem. Podem nos forçar a entrar no remoinho, mas nossas pernas cooperam.

- João, se um dia eu cair no rio, você me arremete a boia?
- Não precisa: você nunca tira o colete salva-vidas!
Verônica Machado
Enviado por Verônica Machado em 06/07/2016
Código do texto: T5689333
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