Escrever para não pirar

Ao escrever, de certo modo, responsabilizo-me pelas futuras interpretações que as palavras irão causar nas pessoas. Mas ao mesmo tempo eu não planejo nada. Deixo-me ser levada pelos pensamentos e pela surpresa do que virá na frase seguinte. Deixo meus dedos digitarem os pensamentos e sou guiada pelo coração. As coisas vão acontecendo à medida em que as primeiras palavras são escritas. Tudo muito natural como uma dança sem coreografia. Tudo é movimento e só faz sentido aqui dentro. É como um tecido que vai sendo construído aos poucos.

Ao sentir-me responsável de certo modo, muitas vezes, o lado criativo fica engavetado. Percebo que o lado sombra sempre é deixado de lado. Ele precisa ficar lá para não afugentar as pessoas e para que eu não perca o foco. Talvez porque meu lado iluminado prevaleça. Ao menos na maior parte dos dias. Porém, a escrita e a dança, são momentos aonde existe a possibilidade de ser eu mesma, além de permitir a loucura de expressar meus sentimentos. Quando eu digo, muitas vezes me perco. Quando eu escrevo ou quando eu danço, eu me encontro. A arte em geral, é minha válvula de escape.

Ao escrever, ao mesmo tempo que preocupo-me em ser sincera, sei que a "verdade" tem várias dimensões. Sei que cada um possui um olhar diante de algo e que as pessoas podem receber o que escrevo de maneira distinta.

Ao mesmo tempo, quando escrevo, é muito mais na tentativa de me conhecer e de colocar meus pensamentos no papel de maneira mais visível e mais "palpável". Posso me contradizer, mas ao mesmo tempo em que busco a liberdade de escrever tudo o que sinto e que desejo, sei que existe o medo do julgamento e o peso da responsabilidade. Transmitir para o papel o que está na mente e no coração é como ficar nu diante do público. Nunca gostei que lessem minhas coisas e as guardava para mim. Porém, hoje sinto necessidade de compartilhar no intuito de encorajar outras pessoas.

Geralmente escrevo sobre fragmentos de lembranças que possuo sobre situações, misturados a minha visão de mundo. Qualquer um pode fazer isso mas para mim é muito prazeroso. A cada palavra, um alívio, um desabafo, uma cura. Eu preciso escrever para sentir-me completa.

Lembro de quando eu comecei a vivenciar as primeiras experiências no colégio e na vontade que eu tinha de colocar aquelas cenas que aconteciam comigo no papel. Eu não queria perdê-las da mente. Eu sabia que um dia tornaria e lê-las e ficaria feliz e orgulhosa daqueles dias. Eram coisas muito simples mas que tinham muito significado para mim. Cadernos e mais cadernos cheios de emoções.

Um dos motivos era que eu conseguia rir sozinha depois de tudo que havia acontecido.

Lembro que quando uma foto era revelada, eu ficava na espera de saber como tinha sido registrado aquele momento. O fato de esperar por aquele momento causava sensações boas e vontade de voltar no tempo. Quando a foto finalmente era revelada e eu já havia esquecido algumas coisas que aconteceram no dia do registro, vinha a surpresa. Hoje tirar uma foto é muito simples e fácil mas devido a rapidez, estamos perdendo cada vez mais o senso de apreciação do momento presente.

Algumas facilidades podem nos deixar menos sensíveis ao que é real de verdade. Lembro que eu gostava de observar o modo como as pessoas agiam e falavam, o modo como pensavam, o modo como andavam, se expressavam, sorriam, choravam. Era tudo muito curioso.

Eu fui passando de espectadora para autora muito gradativamente. A ponto de nem perceber isso. Quando me vi, eu estava virando adulta e os sonhos foram ao poucos deixados de lado. Não fazia muito sentido mostrar meu mundo interior cheio de questionamentos a quem era raso e não refletia sobre aquilo. Eu buscava respostas em meio a tantas perguntas o tempo todo. Eu ainda, as busco. Aos poucos, a sensação de que a lagarta estava virando borboleta. Uma borboleta que precisa de liberdade, do sol, das pessoas e da vida.

Jaqueline Motter
Enviado por Jaqueline Motter em 11/08/2017
Reeditado em 11/08/2017
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