Vive-se um dia após o outro

Vive-se um dia após o outro, tenta-se viver como dá, mesmo sendo um idiota. Tenta-se viver como dá, mesmo sem emprego. Tenta-se viver como dá, mesmo colhendo ódio. Tenta-se viver como dá, mesmo com os pais doentes. Tenta-se viver como dá, mesmo sem mais dinheiro para aluguel. Tenta-se viver como dá, mesmo com dores viscerais. Tenta-se viver como dá, mesmo esperando horas na fila do hospital. Tenta-se viver como dá, mesmo sem com quem contar. Tenta-se viver como dá, mesmo com mais armas que livros. Tenta-se viver como dá. Um dia, porém, percebe-se que se supor idiota não é mais relevante; que o emprego não mais sustenta; que se colhe ódio com indiferença; que os pais já se foram há algum tempo; que o aluguel é apenas uma preocupação fútil do dia-a-dia; que as dores e a fila do hospital parecem não mais atingir a carne; que a falta de alguém significa apenas a perda da companhia de outro solitário; que armas e livros, tanto faz, não livram o ser humano dele mesmo. Nesse dia, tentar viver fará algum sentido?