A Dor do Sorriso

Eu erro em cada traço; falho a cada letra e a cada vã tentativa de furtar-me de meu íntimo vejo-me ainda mais atado a mim mesmo. A esperança de fugir de mim é o que traz a pena à mão, mas o escarlate da tinta escorre pelo oco do instrumento como se fosse meu sangue a sair das veias para lembrar-me, estampada ali, diante de mim, que já não há saída.

Eu sou muitos. A cada cenário, uma nova personagem, um baile de máscaras de um homem só. Mas, na multiplicidade de personalidades, há verdade em cada qual, de forma que nenhuma seja falsa, nenhuma genuína, entretanto. Mil faces a coexistir, não tão harmoniosamente, num único corpo.

Por ser um para cada um, acabo por não ser por mim. Conheço-me o suficiente para desagradar-me de mim mesmo, mas jamais o suficiente para compreender-me por completo. Filtro as dores que me destroçam as entranhas para vomitar felicidade em quem puder, ainda que esse vômito machuque ainda mais.

Já não me permito o luxo de desejar e já não nutro esperanças de dias melhores; tento, apenas, não transbordar nos outros o pesar que me preenche. Já vivi mil temores, dentre os quais destaco o de morrer no anonimato. Hoje, temo somente vier o suficiente para perdê-lo.