Os números

Sempre odiei números, principalmente, àqueles que, supostamente, definiriam de qual tamanho seria o meu corpo. E daí se tenho um corpo magro ou gordo? O que me torna realmente alguém bonito, saudável e feliz? Essas perguntas tantas vezes rondaram os meus pensamentos e me assustaram. Quantas vezes, olhei-me no espelho e não tive uma imagem real de mim mesma? Enfim, o que nos define? São os números? É a rejeição deles? Ou é o equilíbrio entre a quantidade do que você come e a compreensão do que você está comendo?

Nessa busca incessante, a de sanar todas as minhas inquietações, fui me descobrindo uma mulher aparentemente muito forte, cheia de marra, a “super poderosa”, a menina gorda, que não está nem aí para o que pensam dela... pura enganação, por fora, cascuda, sorridente, inabalável, indestrutível; mas, por dentro, uma menininha pequenininha, frágil, toda machucada, ferida, com medo de tudo, que não se aceitava e tudo o que desejava era se encaixar nos padrões...Todavia, que padrões?

Meu corpo era diferente, sempre fui diferente...um pouco mais alta, sempre mais robusta, pernas grossas, cintura fina, dobrinhas na barriga, bumbum acentuado. Um fato: eu era a maior de todas as minhas coleguinhas. O que eu não sabia é que eu era maior, não apenas por ser maior, mas por me achar maior do que eu realmente era, porque sempre vi meu corpo como uma grande aberração.

Fui crescendo com essa visão destorcida de mim mesma. Minha fuga era sempre a mesma, contentar-me com aquilo que me dava prazer – com o que dá prazer a um monte de gente, não só a mim – comer! Como na musiquinha “Comer, comer, comer, comer, é o melhor para poder crescer”...Pois bem...fui crescendo, até precisar fazer uma cirurgia bariátrica, porque cresci demais e já não suportava os olhares de preocupação dos meus pais.

O tempo passou, e o meu crescimento desacelerou, mas foi resolvido? Não! “Por que não?” era a nova pergunta que pairava em minha mente. Pulando de médico em médico, buscando mil e uma soluções mirabolantes, desculpas e mais desculpas, fui tropeçando muito até chegar aonde estou...No final? Nada! No comecinho!

Conheci o programa “Nutrição sem pressão” há uns dois anos, quando a dra Mariana foi dar uma palestra em um grupo psicossocial que eu participo no NAMI, na UNIFOR, Fortaleza-CE. O grupo “O peso do peso” é voltado para pacientes que apresentam problemas com obesidade e/ou transtornos alimentares, que, no meu caso, hoje eu sei, diferenciar uma coisa da outra. Antes de iniciar meu tratamento, tinha a concepção carregada dos preceitos que todos têm sobre o que é ser gordo: é ser doente! Santa ingenuidade ou ignorância, descobri que nem todo obeso tem transtorno alimentar, bem como nem toda pessoa que tem este tipo de transtorno é obesa. Ademais à questão de saúde vai muito além do formato do seu corpo. É algo que está relacionado ao seu Eu por inteiro, seus nutrientes, sua mente, seu espírito, sua vitalidade... Está mais relacionado com a maneira como você vem levando sua vida e alimentando sua máquina.

Fazendo uma analogia simples, o nosso corpo é como um carro. Certo dia, presenciei um carro velho puxando um carro novo que havia apresentado problemas na embreagem. Pasmem! O carro velho, caindo aos pedaços era quem puxava o carro novo, lindo, zerado e ainda com cheirinho de novo. Essa é uma prova de que beleza exterior não significa qualidade de vida. Obviamente, não estou querendo dizer com isso que se deve descuidar da aparência, não! Não é isso. Estou querendo dizer que devemos nos concentrar no que realmente vale a pena: viver!

A primeira vez em que vi a dra Mariana fiquei emocionada, porque finalmente, depois de pular tanto de galho em galho – no caso, de nutricionista em nutricionista – senti que eu não era a única a ter essas inquietações e que eu poderia, sim, aprender a conhecer meu corpo, meus limites e as minhas necessidades, sem ficar me sentindo numa masmorra, enclausurada e cheia de amarguras por não poder comer livremente sem me sentir culpada. Neste dia, a dra falou sobre alimentação saudável e comer sem culpa. Saí da sala com a sensação de que desta vez a tal da balança não iria mais ser minha inimiga.

Já estou há quase dois anos sendo paciente da dra Mariana. Passei por muitos altos e baixos, não virei uma super top model (na verdade, sequer me preocupei em emagrecer, nunca foi o meu foco), mas há quase dois anos não tenho aquele efeito sanfona, e já consigo, mesmo que com dificuldades, enxergar o meu corpo; subo na balança sem medo; não tenho vergonha de vestir uma roupinha mais colada, sensual e adequada a minha idade e, principalmente, minha relação com os números passou a ser uma relação amigável e super harmoniosa. Vocês devem estar se perguntando: É magia? Não, gente! É, simplesmente, o resultado, de uma corresponsabilidade entre as pesquisas de uma nutricionista super competente, junto a suas amigas psicólogas e outras profissionais e nós mesmas, pacientes, que nos damos as oportunidades de tentar pegar mais leve, de dar mais um passo, de ir mais um pouquinho além. É simplesmente isso!