Descansou em Auschwitz

Há textos por aí dizendo que tal pessoa "faleceu no Holocausto", "faleceu no campo de concentração", "faleceu em Auschwitz".

Ninguém "falece" no Holocausto. Você falece numa cama, num quarto de hospital, com pessoas em volta cuidando de você. Às vezes falece de repente, no meio da rua, no trânsito, numa bobagem qualquer, mas sempre como uma consequência natural.

Ninguém "morre" no Holocausto também. Quem morre é senhor da própria morte. É o corpo da pessoa que, seguindo processos biológicos naturais, falha, contra a sua vontade - esta é a morte.

"Perdeu a vida" chega a ser uma sacanagem. Faz acreditar quase em um descuido, uma falta de atenção, um acidente qualquer.

Mais um pouco e alguém dirá "descansou em Auschwitz".

"Foi morto" é um pouco melhor, mas ainda é insuficiente. O melhor nesses casos é dizer tudo sem meias-palavras: "foi executado", "foi assassinado", "foi liquidado", "foi trucidado" - a verdade, enfim.

Henrique Fendrich
Enviado por Henrique Fendrich em 16/08/2023
Reeditado em 16/08/2023
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