Hermes é? ("É isso?")

Zeus não nutre amor por seus filhos. O império que ele construiu repousa sobre lágrimas, humilhações e, em resumo, em seu ego ferido. Hermes, o mensageiro, teve sua "honra" reconstruída por meio da astúcia que arrancou da teia do destino a verdade. Caso contrário, seria relegado ao esquecimento, o oposto da imortal Mnemósine. Continua, então, subestimado, simplesmente por ser o deus mais grandioso e multifacetado da mitologia grega.

Desde jovem, Hermes teve que se unir à sua sombra para, enfim, arrancar de Apolo (não diretamente de Zeus) a confissão de sua genialidade. A infância de Hermes foi marcada por desafios e artimanhas, uma jornada que o forjou como o deus das fronteiras e dos limites. Seu envolvimento com a sombra desde cedo moldou sua visão única do mundo divino.

Não há música entoada pela lira mais bela do que aquela que Hermes dedica aos deuses e à cosmogonia. Suas canções transcendem o simples entretenimento; elas são uma sutil crítica ao próprio Olimpo, revelando as falhas e os questionamentos que permeiam a existência dos deuses.

O sorriso que Hermes arranca de Zeus, ao perceber suas artimanhas e sagacidade, não é o mesmo olhar sereno e contemplativo que ele dirige a Apolo; em Hermes, há uma desconfiança de que ele não é quem parece ser. Essa profunda desconfiança pode derivar do fato de que Zeus, além de sagaz e astuto, foi imoral ao compartilhar os reinos com seus irmãos após a vitória sobre os titãs. Zeus, o governante supremo, se vê confrontado pela sombra de sua própria decisão, questionando a justeza de seu reinado.

Existe mesmo mérito justo em seu reinado? E quanto a todos os seus feitos? Estaria Zeus confrontando sua própria sombra diante de Hermes? Diante de Hermes, Zeus sente o calafrio de sua própria existência, uma reflexão profunda sobre as escolhas que moldaram não apenas o destino dos deuses, mas também a essência de sua divindade, que é a negação.