Atrás do trio elétrico. Só não vai quem já morreu.

A vida, a cada minuto que passa, está grávida. Está grávida de morte. - Lúcia Santaella

Coloco em início essa frase, pois diz muito. Essa frase é de Santaella, a dama da semiótica. Lembro também de Roland Barthes falar algo parecido, dizer que a fotografia é o flagra do tempo, o aprisionamento.

O texto, além de uma coisa narcísica, (falar sobre nós mesmos), é também prisão, espelho, monólogo.

Há quem diga que não tem documento histórico melhor que os romances, folhetins, crônicas. Nada diz mais sobre os costumes do que a imitação feita pelo escritor. É a antropologia do chão.

Essa frase do início, de Santaella, me deu medo, susto. A fotografia, dizem, rouba a alma, é mal estar, é o duplo, o aplacar do correr do tempo, lembrança eterna do que não mais existe, e eu quando escrevo sou puro ego, quero evitar ser perecível da maneira que consigo, quero me cristalizar imortal, até nas coisas que me enfraquecem.

O amor me enfraquece, mas nele, é onde o que eu escrevo, ecoa na maior potência e avidez, o medo é talvez a coisa que mais me fascina, desde os dos filmes de terror, até os muitos abismos possíveis, escrevo. O mundo me dá ansiedade, mas é nele que me deito e digo, e falo, e ressalvo, e comento, e sinalizo, como se, soberbo, o meu olhar acha notar aquilo que ninguém mais viu, quando na verdade, tudo está aí pra ser visto. Ilusão.

O ofício da escrita é sempre necessário. Querendo ou não, o Brasil sempre quis saber sobre o Brasil. Foi com esse enredo: "Brasiléia Desvairada: a Busca de Mário de Andrade por um País" Que a mocidade levou o carnaval. Não que eu queira me comparar ao escritor modernista, mas é por isso, também, que escrevo, para mim e para o outro.

"O texto publicado, é uma foto do meu passado recente; diariamente atualizado." Pedro Cardoso, em seu Instagram.

Lá fora ainda é carnaval, quase fim, de término e cinza, as pessoas caminham e cantam e tocam e bebem e celebram, pela simples razão de que não a motivo pra não o fazê-lo.

Me sinto esgotado, sou as cinzas de quarta feira, queria que fosse pra sempre carnaval, queria que passasse bloco sem fim como cobra gigante. Queria ser carnaval ao seu lado. Fora disso, fora do carnaval, é protocolo e rotina, com doses homeopáticas de loucura na sexta, no sábado, e para os mais ousados, no domingo, mas num sempre lembrete que segunda recomeça a vida. Isso pros que podem, pros que podem sorrir, pros que podem parar, e pagar. Felicidade pode até não se comprar, mas ser feliz demora, leva tempo.

O ainda pior disso tudo é que não são muitos os que podem, escrever é matéria de ócio dedicado, de energia e temor infinito. É potência.

Potência que segundo a física, é"Trabalho sobre tempo", uma fórmula matemática. E até aqui, ela, a palavra"trabalho", aparece.

E vou eu de novo com minhas apontações a respeito das coisas como se, ninguém tivesse antes já falado, mas é isso, é a fuga, tenho que logo em seguida, achar um novo assunto.

Escrever é tarefa ingrata, de estar sempre ou no futuro, ou no passado, nunca presente, pois presente é vapor que não existe, é o transitório, o olho na lembrança outro na espera, um pé no que virá, outro no que foi, assim vamos nos corpo-dividindo, no tentar se entender no caminho.

Na espera do nascer da morte.

Que venha agora o São João.