Sagitário

Para quem está pensando em ter um filho: evite amar sem proteção em março. Poderá nascer mais um sagitariano.

Seu filho, independente do sexo, lhe fará perguntas difíceis de serem respondidas. Vai querer subir em árvores, tropeçará sozinho num campo de futebol vazio; mas será saudavelmente rústico, viverá com os joelhos esfolados e na maioria das vezes nem se lembrará do que causou o machucado. Esquecerá as coisas, especialmente as ruins, mas esquecerá também todas as outras (mesmo as mais importantes); aprenderá sim com os erros, os seus e os dos outros, mas ainda assim errará muito. E questionará os pais tanto para desafiá-los quanto para se impor – impor-se para si mesmo, pois detestará admitir que tem um imenso respeito (e um certo temor) pela autoridade e pela hierarquia.

Esse ser humano terá registrada em suas células a figura do centauro, ainda que faça questão de não crer em astrologia ou em nada que não possa ser visto ou tocado, ao mesmo tempo em que tem a fé como mola mestra... E a figura do centauro, metade humana metade animal, se manifestará sempre que sua ingenuidade inata se sinta ameaçada: sua mania de dizer apenas a verdade (ainda que seja uma verdade em que só ele acredita) o fará também crer que todas as pessoas são exatamente assim. E se decepcionará, pois tem a certeza de que está absolutamente certo. Talvez a única pessoa certa no Universo.

Sua humildade natural será acompanhada de um orgulho tão grande que, travestido de indiferença, o fará crer que é apenas um espectador da vida, e que tudo o orbita com alegria. Cansará de ouvir as pessoas dizerem que tem sorte; e, acreditando piamente nisso, será otimista até o limite da irresponsabilidade.

Será escavo da liberdade que quer para si; será tachado, nem sempre injustamente, de egoísta, pois uma estrada aberta à frente o hipnotizará, chamando-o como um canto de sereia e fazendo-o esquecer-se de todo o resto. E, escravizado por ela, não compreenderá que a liberdade está dentro dele, e não é necessariamente tolhida pelo seu pior fantasma: o dos vínculos permanentes.

Permanente, eterno, para sempre, nunca: palavras que ele evitará usar, ainda que possa lançar mão delas eventualmente, num de seus rompantes teatrais. Brasa coberta, alma inquieta, a dualidade vai permear sua vida de forma contínua: terá uma inabalável auto estima baseada em não levar-se a sério. Buscará uma novidade por dia, cansando-se dela no minuto seguinte; amará o improviso mas sentirá falta de rotina, fará planos mirabolantes mas não terá um caminho estruturado para executá-los, terá inúmeros objetivos mas nenhuma idéia prática de como alcançá-los. Será confiável mas não pontual, apaixonado mas não dócil, cheio de energia mas sem foco. Sem disciplina. Sem método. Cem mil flechas atiradas a esmo, desperdiçadas pelo seu arco nem sempre certeiro.

Para os que vêem nos signos algum significado, concebam apenas a partir de abril. Um capricorniano talvez seja uma aposta mais significativa.

E para os que crêem que todo este palavreado é insignificante, por favor me avisem. Não posso mudar de signo mas posso rever meus desígnios.