UM FINAL FELIZ

Terei o fim mais trágico e feliz que alguém jamais imaginou. Quero alimentar de vez os urubus da ignorância que sobrevoam minha carcaça já disforme, em busca de sagrado alimento.

O sabor de mil facas afiadas percorrendo todo o meu ser, rasgando pouco a pouco a carne macia, deixando escorrer por entre as casas o líquido ralo que destruirá os muros que separam quintais.

Minha boca gritará até que se espume, acordando o mundo inteiro que jamais conseguirá dormir outra vez, devido a minha voz estridente pesando em suas consciências sujas e pecadoras.

Meus ouvidos estourarão, evitando que cheguem até mim o choro das crianças que passam fome, o gemido daqueles que se definham em hospitais, o rugido das balas de canhão e as promessas daqueles que nos governam.

Que o meu coração pare em protesto a destruição do planeta, em protesto a favor de minha mãe natureza que vê a chama da ganância e do egoismo consumir suas matas e matar seus filhinhos da forma mais cruel possível.

Que meus olhos se fechem e as lágrimas sequem, a fim de que não tenha quer ver a raça humana se extinguir pelas mãos de suas próprias invenções e nem tenha que chorar um futuro novo que teima em repetir o passado.

As pernas perderão a força e não precisarei andar sem rumo, procurando meu caminho por entre escombros e lixos que se encontram nas estradas tortuosas e atrativas dessa vida.

E que enfim minha mente exploda e minhas idéias voem pelos ares se propagando e dissipando toda essa babaquice que hoje paira sobre nossas cabeças.

Minha morte não será em vão e a mosca que ira me substituir vai cumprir fielmente seu papel, pousando a cada dia em sua sopa, deixando nela o germe do inconformismo.

Rogério Marcelino
Enviado por Rogério Marcelino em 09/04/2008
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