PRIMAVERA ENTRE OS DENTES

Meu outono se aproxima, quantos verões deixei de ter em troca deste inverno que não acaba faz anos. Uma flor bastaria para despertar a primavera que carrego entre meus dentes. As folhas caem sem nada mais a dizer, não as recolho, não escrevo, não digo. Segui sem escalas até aqui para saber o que não era segredo a tempos atrás, nada. Sei como é, entendo, sei que entender custa caro, e não podemos parcelar a divida quando se é cobrada. Saber, então, se torna impossível quitar o debito com a vida. Claro, quando pouco se sabe, pouco se entende, tudo é acessível, sem questões preliminares ou mensagens subliminares, apenas, vivemos, sem a reta paralela que nos diz o caminho verdadeiro ao qual pisamos, nos negando as primaveras em um mundo de flores artificiais. Gostaria seguir por ai, ir o mais distante possível e tentar acalmar minha alma. Percebo que tenho mil cavalos selvagens presos em meu peito, não conformados com sua prisão, inquietos, valentes, mas ali, presos, espreitam e esperam o melhor momento de soprar junto ao vento seus galopes flamejantes e queimar toda a tristeza daqueles dias amargos de prisão, acender o verão de meu mundo e soltar a primavera de meus dentes. Largar minhas palavras em solo fértil, e cultivar uma vida impar que se tornaria sempre florida. Gosto das cores, gosto do perfume da vida. Sinto que ando semeando flores em meio a neve, procurarei novos horizontes, belos horizontes. Solto a palavra. A palavra, abre as portas de meu coração, e corre mundo junto aos mil cavalos de minha alma, não quero sentir mais o frio, mas vou buscar os segredos do vento, não pertenço ao tempo, não creio, não aceito estes parâmetros, quero um mundo feito por mim, sem contradições, apenas flores e perfume, quero sentir, respirar, e viver solto na vastidão de meu querer, amar e talvez ser amado, mas permitir que as sementes que carreguei por tanto tempo, tenham no mínimo, sua chance de nascer.