Casmurro
Uma parte de mim ainda te quer.
Outra parte de mim só te renega.
Essa parte de mim, que vês, que é mulher
Deseja-te, homem, e não nega.
Mas esta outra que em mim habita
Culpa-te, amor, e não te perdoa,
Por mais que minha razão reflita,
Por mais que essa sensação me doa...
Lembro o dia em que me deixaste
Por razões que dizes desconhecer.
E após quatro estações tu retornas,
Sem de tua sobra te aperceber...
Já esqueceste tudo o que fizeste:
O veneno mortal em tuas adagas
Transpassando o coração que quiseste,
Enquanto por minha dor indagavas...
Não morri, percebes? Ainda vivo!
E é teu o veneno que me alimenta.
E o doce amor, agora nocivo,
Me causa náusea, me atormenta...
Pois outra cama deixaste inda quente
Pra voltar à sua antiga vidinha.
E eu, mulher, te recebi contente
E te ouvi de novo dizer: _ Tu és minha...
Mas esta outra que em mim habita
Não quer pra ti uma vida enfadonha.
Quer, no fundo, que tudo se repita:
Devolver-te as adagas não é vergonha