ADAPTADO PELO ÓPIO

Filho bastardo

Duma pátria prostituta

Genitora de proletariado

Vivo sempre à procura

Em intervalos esporádicos

Duma engrenagem segura

Onde possa adaptar-me

Porém engrenagens complexas

Não aceitam mola tão prosaica

E eu...

Ai de mim

De fato sou tão prosaico

Através de um mecanismo de desventuras

Apenas duas coisas me valem

Ora noites de festas e procura

Ora dias de febre na testa e cansaço

Nada me prende a nada

Ao sair pelas ruas armo-me

Visto uma armadura em minh'alma

E deixo os meus sentidos em alarde

Procuro proteger-me

Porém a doença é inevitável

Minh'alma ficou louca

Clama por sua dose diária de ópio

Alma outrora chama viva

Tornou-se reles brasa

E minha memória

Outrora impressionista e encantada

Digna duma obra de arte

Tornou-se fria e obscura

Como as cores de Frida Kahlo

Daí vem sempre aquela busca

A cada dia

Uma paixão nova

Desejando mil coisas

Todas juntas

Devorando-me por dentro

Com fome semelhante

À dos minutos contentes

Ao devorar as horas tediosas

Só assim

Os dias convalescem

Visto que o ópio consala-me

E trazem consigo

Alguns instantes de misericórdia

Marcelo Lopes
Enviado por Marcelo Lopes em 08/03/2007
Reeditado em 08/03/2007
Código do texto: T405692