Origem dos sinônimos

Tanto faz que acordei

E hoje o dia ainda recordo

Em que uma vida eu adotei,

Uma sina triste da qual discordo.

Tantas almas que calei

E as fiz borrar sua existência;

Tantos sonhos que apaguei

Com meu nascer de inocência.

Um sonho que a mais nasceu

Ao destino de ser penado

E o peso logo sofreu

Da cruz lhe encargado.

Um ente que se perdeu

Na madrugada em que nascia;

O parente, desconheceu

Mas a outros convalescia.

O sorriso que recebi

Impossível me esquecê-lo,

De uma família a quem me uni

Pisoteada no alheio.

À medida que crescia,

As risas se transformaram,

Dores conhecia

E momentos me calaram.

Entendi, então, a maldade

Que o mundo já trazia

E chorei na crueldade

Que seu desprezo me fazia.

Tornou-se amiga a solidão,

Nas longas horas da madrugada

E a frialdade, a sensação

Do morto olhar de minha fachada.

As horas se revelaram,

Na eternidade de uma pena,

Em que agonias me despertaram

E me roubaram a tez serena.

Surgiu-me o medo da fantasia

Pois devaneios não me salvaram,

E fiz da sina a primazia

De que meus dias já se acabaram.

Pedi amor como esperança,

Mas os tristes não são amados

E tal carência qual criança:

Os olhos, em lágrima, encharcados.

Talvez me dessem mãos

E eu fingia que não as via,

Porém difícil crer em irmãos

Onde em maldade se jazia.

Fiquei sozinho, é certo

E tão longe de um amparo;

Por isso vi a morte perto

Seduzindo meu ego amaro.

Agora estou, aqui herdeiro

De tanto parto agraciado,

Em um mar de nevoeiro

À espera de um passo afundado.

Assim deixo meu pranto

Que só meu quarto possa escutar:

O sorriso que perde encanto

Pela ilusão que souberam silenciar.

O sucesso em minha ausência

É que meu adeus jamais ouviram;

Só o espelho vê a diferença

Que alma e corpo se despediram.

Um espaço em branco habitarei

Entre as covas dos anônimos,

E em horizontes me perderei

Vos deixando outros, meus sinônimos.

Vitor Barros
Enviado por Vitor Barros em 20/08/2005
Código do texto: T43909