À ANNA DE CARANGOLA
À Anna de Carangola
Josafá Sobreira da Silva
Poema dedicado à minha mãe, Anna,
natural de Carangola, MG, por quem
eu procurei para casar-se com meu
pai. Como? Só lendo o poema...
Vocês viram por aí
a Anna de Carangola?
Faz covinhas, quando ri,
e usa uns brincos de argola...
É mulher formosa à vista!
Tem jeito de normalista
e a ninguém jamais deu bola!
Tem, também, um ar cigano,
belo timbre de soprano
que encanta, se cantarola!...
Fiz diversas entrevistas,
mas restaram poucas pistas...
Certo pé de carambola
tem, no tronco, gravações:
dois pequenos corações
que ela fez, ao vir da escola...
Vocês viram por aí
a Anna de Carangola?
Faz covinhas, quando ri,
e usa uns brincos de argola...
Quase rindo, ela escreveu
somente a palavra "eu"
no primeiro coração.
O outro, deixou vazio,
mas, ao concluir seu feitio,
Anna chorou de emoção.
Dizem que, de vez em quando,
ainda volta ali, chorando,
onde transborda de afago
e, com certo frenesi,
pousa os lábios de rubi
no coração... ainda vago.
Vocês viram por aí
a Anna de Carangola?
Faz covinhas, quando ri,
e usa uns brincos de argola...
Dos beijos que Anna deixou,
da emoção que a dominou,
ouvi, mesmo, alguém contando!
Quem sabe, não desejasse
ter alguém que a acompanhasse
nas coisas que foi gravando?
Seu drama deixou-me aflito!
Quem viu seu rosto bonito?
Por favor, digam-me agora!
Não perdi o meu juízo:
Tenho de achá-la, é preciso!
Sem ela, não vou-me embora!
Vocês viram por aí
a Anna de Carangola?
Faz covinhas, quando ri,
e usa uns brincos de argola...
É meu verso, a minha rima,
minha luz que vem de cima,
flor de encanto e fantasia...
Dos sonhos dessa mulher
(acredite quem quiser!)
depende a minha poesia.
Nessa essência feminina
meu devir se descortina...
Tem algo que é meu, também.
Sou fictício, ser abstrato,
sem essência, sem formato...
Sem ela não sou ninguém!
Vocês viram por aí
a Anna de Carangola?
Faz covinhas, quando ri,
e usa uns brincos de argola...
Quem sou eu que lhes pergunto?
Não sou vivo, nem defunto,
nem ente desencarnado;
não sou criança, nem feto;
não sou mente, nem projeto...
nem sei fazer-me explicado
Quem sou eu, que lhes indago?
Quem sabe um anseio vago
de um Desígnio Superior?
Sou ficção e realidade,
soberana faculdade
do Supremo Criador.
Vocês viram por aí
a Anna de Carangola?
Faz covinhas, quando ri,
e usa uns brincos de argola...
É concreta e eu, faculdade,
aquém da realidade,
que nem chega a ser um plano!
Sou a opção de quem projeta,
que cisma em virar poeta,
que anseia tornar-se humano.
Humano pra ter história
ver o gosto da vitória
pelos olhos de um mortal,
com mortais interagindo
e os opostos coincidindo
num milagre conjugal.
Vocês viram por aí
a Anna de Carangola?
Faz covinhas, quando ri,
e usa uns brincos de argola...
Ela existe em minha ausência
e eu careço de existência,
como vida não gerada.
Sou a esposa sem marido,
sou o filho não parido,
sou a síndrome do nada!
E eu a busco, sem sossego,
para alguém de intenso apego,
que entre seus braços a tome.
E esse honrado rapazola,
lá, no pé de carambola,
gravará, também, seu nome.
Vocês viram por aí
a Anna de Carangola?
Faz covinhas, quando ri,
e usa uns brincos de argola...
Hei de achá-la, falo sério!
Faz parte do meu mistério,
que me assusta e que me atrai.
Sou o poeta do futuro,
que dá voz ao nada obscuro
que entende quanto a procuro
pra esposa do próprio pai!
Vocês viram por aí
a mulher que eu descrevi,
a Anna de Carangola?
Tem os lábios de rubi
e... ainda não me esqueci:
faz covinhas, quando ri,
e usa uns brincos de argola.