Cruz

Lá vai lento qual cágado

Depois de drogar o fígado,

O meu vizinho bêbado,

Esposa disfarça vergonha...

Seguindo odor etílico,

Bebendo amargor empírico,

Ouvindo argumento cínico,

Com uma saída ela sonha...

O começo pareceu mágico,

Encanto surgiu fúlgido,

Escondeu futuro trágico,

E ela mordeu a isca...

Agora só um par frígido,

Ímpar, pois falta um dígito,

Aquele que fora hígido,

Enferma de dar na vista...

Ela sofre sua sina mísera,

Quisera ser aquela alígera,

Enquanto ele queima víscera,

Voaria pra um canto seu...

Mas, segue, silêncio pétreo,

Na rua, no quarto, no átrio;

Carregando o peso pátrio,

A cruz que ela escolheu...