A LEMBRANÇA DO CANDIDATO

(Cícero Manoel)

É muito difícil o pobre

Ter um amigo ricão,

Porém, quando vem chegando

O tempo de eleição,

Sempre o pobre acha um rico

Para apertar sua mão.

No tempo de eleição

O pobre é valorizado,

Vira amigo do rico,

Passa a ser procurado,

Só nesse tempo o pobre

Pelo rico é visitado.

Nesse tempo pelo rico

O pobre é reconhecido,

Ganha carona em carrão,

Passa a ser muito querido

Ganha abraço e ganha beijo

O cheiroso e o fedido.

Só nesse tempo o pobre

Que às vezes nem tem o pão,

Conhece o cheiro e a cor

Do dinheiro do ricão,

Pobre vira gente fina

No tempo de eleição.

Na minha pobre cidade

Na última eleição

Surgiu lá um candidato

Andando na região

Com o bolso cheio de dinheiro

Apertando toda mão.

Falava com todo mundo

No lugar que ele chegava

Cumprimentava o povo

Dava beijo e abraçava

Acenando com a mão

No carrão ele passava.

Numa rua da cidade

Residia Oliveira

Com a mulher margarida

Que tinha sido parteira,

E sua filha Clarice

Uma mocinha solteira.

Uma tarde de domingo

Desse modo se passou:

Na casa de Oliveira

O candidato chegou,

Viu Oliveira na porta

E sua mão apertou.

Disse o homem: — Bora entrar?

O candidato adentrou.

Pegou na mão da mulher,

A mocinha abraçou

Pediu o voto dos três

E o santinho entregou.

Na saída ele falou

Com muita tranquilidade:

— Amigos eu quero ser

Vereador da cidade

Pra trabalhar pelo povo

Da nossa sociedade!

Dias depois a mocinha

Chegou contente de mais,

Disse: — Aquele candidato

Na Rua dos Marechais

Hoje entregou para mim

Cento e cinquenta reais.

Cinquenta é para mim

Cinquenta é para o senhor

E cinquenta é para mãe

Comprar o ventilador,

O candidato é bom

Já é meu vereador!

Oliveira vendo as notas

Na hora assim falou:

— Aquele cabra é bom

Só ele nos ajudou,

Vamos votar no rapaz,

Por mim ele já ganhou!

No dia da votação

Veja o que aconteceu:

Votaram no candidato

Dizendo: — Ele já venceu!

Quando contaram os votos,

O miserável perdeu.

Ele pra se eleger

Deu dinheiro adoidado,

Mas o povo foi sabido

E enganou o danado,

Quase ninguém votou nele,

Por isso foi derrotado.

Depois da sua derrota

Logo ele se retirou,

Da cidade foi embora

Pra bem longe viajou,

Seus pés naquela cidade

Nunca mais ele botou.

Um mês depois na cidade

Um fato se sucedeu:

Oliveira aperreou-se

E quase enlouqueceu,

A sua querida filha

Grávida pareceu.

Chamando a moça num canto

Ele disse: — Minha flor,

Quem é o pai desse filho?

Disse a moça sem pudor:

— Aquele moço que a gente

Votou pra vereador.

Oliveira ficou branco

Caçou força lá no fundo,

E gritou: — Filho da peste!

Eita Satanás Cacundo!

Desonrou a minha filha

E foi pro oco do mundo!

Ainda lhe perguntou:

— Como isso aconteceu?

Aí ela olhou pra ele,

E assim lhe respondeu:

— No seu carro uma carona

Ele me ofereceu.

O moço me seduziu

Com modos especiais,

Na cama dele eu fui

Só dele e de ninguém mais,

Na saída ele me deu

Cento e cinquenta reais.

Oliveira ouvindo isso

Ficou muito enraivado,

Se achasse o candidato

Ele estaria acabado

Enfincaria a faca

No bucho do desgraçado.

Aquele ricão safado

A pobre moça enganou,

Colocou ela no carro

E pra cama a levou,

Tirou sua virgindade

E ainda lhe pagou.

A moça virou piada

Naquela cidade inteira

Nunca mais o candidato

Pisou naquela ribeira

Mas deixou como lembrança

O neto de Oliveira.

(Sítio Ilha Grande / Santana do Mundaú – AL / 26 de junho de 2012)

Cícero Manoel (Cordelista)
Enviado por Cícero Manoel (Cordelista) em 14/04/2019
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