DESAFIO I

Vem me destruir, ventania

Vem celebrar sobre mim sua vitória

sobre todas as importâncias inúteis

sobre todos os solos inférteis

e poções mágicas feitas de chuva.

Varre como pó os pensamentos

as certezas duvidosas

baseadas em decretos de um rei destronado

Canta, uivando em meus ouvidos

tua melodia amarelada

E espanta com teu uivo, Ventania

toda a poeira dos móveis desgastados

penetra nos meus poros e assusta

em meu interior, todos os Deuses adormecidos

desde tempos imemoriais, imemoriáveis.

Arrebente a telha da minha casa

mal-construida, esburacada

casa dolorida no verso da folha

e que cale a minha subjetividade

com tua voz furiosa.

Venha! Com toda a tua força

Que abrirei minha janela

e ainda que me atemorize

vou ficar alí, prostrada, sentindo

tua chegada como brisa.

E traga teu amigo, o raio

tua tia, tempestade

com sua filha, tua prima, chuva de verão

O meu céu já ta escuro, Ventania

Que esperas?

Não estou eu te chamando? de braços abertos?

A cabeça ta pendida

na mão do carrasco, na forca

Não arraste contigo flores, Ventania

Eu quero facas

Eu quero leite, estragado ou não.

Eu quero muro de pedras, pirâmide

Me arrasta pro abismo

pro fundo, sem salvação.

Entendeu, vento?

Que depois que tu passar

da casa destruída, eu tiro um lápis

e uma pedra

e só com isso, escalo o muro

pra olhar tua partida

do fundo da minha queda.

Eu subo, eu cresço

acima de tu, ventania

acima de teus irmãos.

E olhos, meus Deuses voando

rodopiando, girando, parindo

somando, brincando, amando

eu, os olhos, com tesão.

Do alto, e dessa vez alto, do meu colosso

da minha onipotência por ti desmentida.

Passe por mim, Ventania

a mim, não me passe

que eu não passo por ti

e te passo, talvez.

Não te enfrento, te clamo

te adoro, ó chuva

e teu cheiro me arde o nariz.

Teu nome é vaca

teu nome é vida

cada vida, dolorida

é também morte, sentida.

Que é de você

que me observa de longe?

Vadia!

Já te vi pelo canto do olho

e te condeno

Bravia!

cada uma de mim te tolhe, tempestade?

sou só um grão de areia

teu nome é Ventania!

Não é tu que faz virar os barcos?

Que sacode o mar e o coça entre as ondas?

Eu não sou mar.

mergulha nele, lá em baixo

sob a pedra, escondida

Vai ver uma concha, uma ostra

uma pérola, uma areia

e ali estou eu, Ventania.

Não me tema, que te amo

Não te temo, eu te quero.

Não és o tumulto, és o caos

e do caos eu renasço

Qual fênix, sem queimar

Eu recolho os cacos.

Que eu paro no posto de Tupã

Deus, Jeová, Oxalá, nãoseioquelá...

Não sei nem porque escrevo isso, amiga

talvez só para rimar.

E só escondo o rosto nos braços

porque teu vento faz meu olho queimar.

Maíra Novoa
Enviado por Maíra Novoa em 20/03/2006
Código do texto: T126074