UM DIA COM O DIABO

Hoje, desde os primeiros raios do dia

até a sombria chegada da noite, cheia de olhos

quase pude sentir o toque de suas mão frias

senti sua presença negra ao meu lado

em tudo senti o seu gosto, que de tão amargo

tornou-se doce

Nos outros enxerguei os seus rostos

Nos rostos percebi os seus restos

Tremi em sua sinistra companhia

A fria brisa de um respirar desumano

O arrepio cortante subindo a espinha

Os pelos do braço eriçados

E o cheiro de desgraça, sangue e gritaria

Escutei seus passos à espreita

misturados aos passos da multidão

Te escutei nos ruídos, nos gemidos

Você estava lá, sempre no avesso

no mendigo, no doente, no moribundo

nos espelhos e reflexos do mundo

Você sempre esteve lá, no fundo

no imundo de todas as coisas

nas feias, mas sobretudo nas belas

Nas janelas, nas forcas e nos venenos

Nos sorrisos, nas ruelas, nas estrelas

nas festas, nas igrejas, nas bandejas

no grande e no pequeno

Sorrindo, desde os primeiros tempos

Rastejando e sussurrando o que, enfim

todos nós já sabemos sem querer

e que talvez...

Não seja simplesmente engano

o que proferes ao teu modo profano

e é insuportável à nosso olhar viciado

do que é ser humano