Camelo

A poesia que resta num domingo que faltou,

Sobrou sem graça, como a xepa da feira;

Afinal, o dia deu o que tinha, fez o seu show

E jamais pedi bis, dada a sua pasmaceira...

O infeliz colocou a morte escura na ribalta,

E até a morte viva no assédio do engano;

Essa esquisita sobra denuncia que me falta,

Tecido e confecção, ou, a manga e o pano...

Desculpem se eu pareço sorumbático, trágico,

Expondo lapsos tristes em vez de beleza, lirismo;

Mas, o poeta é um complexo sistema autofágico,

Que faminto de amor devora o próprio organismo...

Masoquista, pela dor, versos belos o tal retribui,

Como se pudesse haurir calor de ambiente frio;

Afinal, à exata proporção que seu alento diminui,

Robustece como se bebesse de um cântaro vazio...

Esse camelo refratário que suporta o vasto deserto,

Parece um anômalo nas provas duras que encara;

tira leite de pedras, quando pelo nada encoberto,

pra disfarçar a vontade de deixar de vez o Saara...