Eis a Consolação da Morte
Jaz aqui
Lar de minhas agonias
Que com suas mãos tão frias
Aprisiona o meu ser
Gelado como um túmulo
Lacrado tal qual um caixão
Onde os únicos que dão o ar da graça
São os vermes da podridão
Acima há estátuas de anjos
E um céu belo azul
Mas os olhos viciados
Enxergam apenas o chão
O fundo do poço
O fim da linha
O cabo da boa esperança
Trazidos no bico do corvo
Ungidos de mágoa e dor
Já sem vida, nem cor
Somos abençoados pelo descanso da morte
É verdade também, entretanto,
Que nem todos desfrutam esta sorte
Pois para alguns ela é um sofrer infernal
Uma eterna flagelação
Mas aos pés do morto resignado, pendurada está
A bonita placa, que diz:
"Não perturbe, eu já morri.
Ignore os pés ambulantes, pois a alma há muito, se desligou"
É
Não há remédio outro,
Senão
O defunto respeitar
As flores que lhe trouxer
Vão murchar e secar
Que nem vai se incomodar
Em contemplar-lhes a beleza e o perfume
Aprendeu a gostar
do chorume
Em que embalsamado
Está
Ouve o tamborilar da pá
Do coveiro ali fora a cavar
Cava cada vez mais fundo
Enterrando mais e mais
É um adormecer
De quem bem se satisfaz
Em evitar sofrer decepção
E já não quer mais lutar, mesmo que pudesse vencer.
Fica ali, portanto
Metido sob a terra
Sete palmos do chão
Chorando o leite derramado
Não admite
Não permite
Não aceita perdoar e esquecer
O que ficou já para trás
Mumificado
Empalhado
Ressecado pelo medo
Jaz.