Minha mala!

Um dia olhei pela manhã, da janela do meu quarto, e vi o dia

lá fora.

Era um belo dia, pensei eu, o sol brilhava deslumbrante.

Virei a cabeça, olhei em volta e pensei é muito pequeno aqui.

Então girei sob meus calcanhares, vesti meu jeans, calcei uma

sandália, coloquei meu chapeuzinho de sol e saí.

Caminhei, caminhei pelas ruas arborizadas da cidade, sem

olhar para trás.

Já anoiteceia e as luzes começavam a iluminar meus passos, o

brilho das luzes era fascinante, inebriava meus sentidos.

Cansada, sentei no banco de um parque debaixo duma frondosa

figueira. No ar, uma brisa suave, na mala um peso selvagem.

Descansei escorada naquele tronco centenário e então abri a

mala. Percebi daí o porquê de tanto peso.

Mue Deus! Ali estavam amontoadas lembranças obscuras,muitas

desilusões, amores perdidos, dores e lamentos, paixões não

correspondidas, obrigações, compromissos, horários,lágrimas

petrificadas, neblinas de tristeza, nenhuma diversão, nada

de alegria, nenhuma loucura, nenhum sax, nenhum blues,

nenhum rock do Led, do The Door, nenhuma poesia do Neruda.

Nada! Nem um trago de conhaque, de rum ou de tequila.

Vi que tudo aquilo merecia o vazio. Deixei minha mala ali

mesmo com todo seu conteúdo e segui enquanto ainda cintila-

vam as estrelas nos céus e o chão firme sob meus pés. Segui,

não olhei para ver se alguém apanhou aquela mala.