Mulheres Negras

Enquanto o couro do chicote cortava a carne,

A dor metabolizada fortificava o caráter

A colônia produziu muito mais que cativos,

Fez heroínas que pra não gerar escravos, matavam os filhos

Não fomos vencidas pela anulação social

Sobrevivemos à ausência na novela, no comercial

O sistema pode até me transformar em empregada,

Mas não pode me fazer raciocinar como criada

Enquanto mulheres convencionais lutam contra o machismo,

As negras duelam pra vencer o machismo, o preconceito, o racismo

Lutam pra reverter o processo de aniquilação

Que encarcera afrodescendentes em cubículos na prisão

Não existe lei Maria da Penha que nos proteja

Da violência de nos submeter aos cargos de limpeza

De ler nos banheiros das faculdades hitleristas,

Fora macacos cotistas

Pelo processo branqueador não sou a beleza padrão,

Mas na lei dos justos sou a personificação da determinação

Navios negreiros e apelidos dados pelo escravizador

Falharam na missão de me dar complexo de inferior

Não sou a subalterna que o senhorio crê que construiu

Meu lugar não é nos calvários do Brasil

Se um dia eu tiver que me alistar no tráfico do morro,

É porque a Lei Áurea não passa de um texto morto

Não precisa se esconder, segurança

Sei que cê tá me seguindo, pela minha feição, minha trança

Sei que no seu curso de protetor de dono praia,

Ensinaram que as negras saem do mercado com produtos em baixo da saia

Não quero um pote de manteiga ou um xampu,

Quero frear o maquinário que me dá rodo e URU

Fazer o meu povo entender que é inadmissível,

Se contentar com as bolsas estudantis do péssimo ensino

Cansei de ver a minha gente nas estatísticas,

Das mães solteiras, detentas, diaristas.

O aço das novas correntes não aprisiona minha mente,

Não me compra e não me faz mostrar os dentes

Mulher negra não se acostume com termo depreciativo

Não é melhor ter cabelo liso, nariz fino

Nossos traços faciais são como letras de um documento

Que mantém vivo o maior crime de todos os tempos

Fique de pé pelos que no mar foram jogados,

Pelos corpos que nos pelourinhos foram descarnados

Não deixe que te façam pensar que o nosso papel na pátria,

É atrair gringo turista interpretando mulata

Podem pagar menos pelos mesmos serviços

Atacar nossas religiões, acusar de feitiços

Menosprezar a nossa contribuição na cultura brasileira,

Mas não podem arrancar o orgulho de nossa pele negra

Mulheres negras são como mantas Kevlar,

Preparadas pela vida para suportar

O racismo, os tiros, o eurocentrismo,

Abalam mais não deixam nossos neurônios cativos.

Eduardo FC
Enviado por FaBinhO Endecha Veraz em 27/05/2013
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