Quando o eu lírico era eu mesmo.

Quando o eu lírico era eu mesmo,

Eu calava que nem bode degolado;

Montanhas despencavam no meu lombo,

Era um boi de piranha fustigado.

Quando o eu lírico era eu mesmo,

Eu sofria de amores pela musa;

A pena ofegante desliava

Capenga, triste, torta e obtusa...

Quando o eu lírico era eu mesmo,

É a letra que matava a todo instante;

Lenda viva que pastava sempre atenta

Ao relho ou ao troar de um berrante.

Quando o eu lírico era eu mesmo,

Me deslocava, à esmo, pelo tempo;

Sofria de amor e de saudade

Nas dores do meu próprio pensamento.

Quando o eu lírico era eu mesmo,

Os sonhos eram longe como a lua;

Que o olhar enamorado só contempla

À sombra da verdade nua e crua.

Hoje, que o eu lírico é um estranho,

Apanho, mas descarto a mais valia;

Montanhas? Deixo a fé tomando conta

E a pena corre solta na poesia.

carlinhos matogrosso
Enviado por carlinhos matogrosso em 28/07/2020
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