Do ofício e das horas

cabe ao poeta

engolir as madrugadas

e amanhecer o verbo

no peito das palavras

cabe ao poeta

a estranha lida

de construir andaimes

nos sonhos que exercita

cabe ao poeta

insurgir a vida

e praticar rebeliões

sob medida

cabe ao poeta

alinhavar o tempo

e caminhar pela calçada

impunemente

cabe ao poeta

ser quase marinheiro

e navegar as âncoras gerais

que se cravam no peito

cabe ao poeta

promover os sábados

à condição de domingos

e distribuir as horas de riso

como gerente dos sentidos

cabe ao poeta

não se pentear

a não ser em espelho

que apenas comente sua face

cabe ao poeta

abster-se da morte à tarde

e nunca morrer sem verbo

que lhe resguarde

cabe ao poeta

os infartos

não os do corpo

mas os da alma

cabe ao poeta

todo discurso

que em não sendo palavra

tenha lógica mais justa

cabe ao poeta

guardar a outra face

e tanger a noite do mundo

com seu grito de liberdade.

Aurélio Aquino
Enviado por Aurélio Aquino em 04/05/2008
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