Mesmices...

Interessante...

Eu noto que, durante a caminhada que eu faço

todas as manhãs pelas ruas do lugar onde eu moro,

não há espaço para a mesmice.

Faço sempre o mesmo percurso,

Sempre pelas mesmas ruas,

Vejo sempre as mesmas árvores que ocupam

sempre o mesmo lugar,

Vejo sempre as mesmas casas, mesmas cercas,

os portões da casas sempre os mesmos,

As pessoas com quem eu cruzo nas ruas, nesses momentos,

também são sempre as mesmas.

Há no ar, sempre um mesmo.

Há no dia sempre um mesmo Sol, quando é dia de Sol;

Há nas flores sempre um mesmo cheiro, uma mesma cor,

Preenchendo o meu mesmo pulmão que aspira um mesmo ar

desse mesmo lugar meu de morar,

há um mesmo perfume, e os meus mesmos olhos que veem

as mesmas cores, um mesmo brilho do mesmo Sol desse mesmo dia.

E, no entanto, nada é o mesmo.

Nem em mim,

e nem mesmo nas coisa que estão sempre ali nas

mesmas ruas do mesmo lugar onde eu moro.

Eu posso sentir que mesmo passando várias vezes

pelo mesmo lugar, olhando varias vezes as mesmas árvores e

flores, e sentindo o mesmo cheiro de perfume pelo mesmo ar

que paira neste meu mesmo lugar de morar

e ouvindo os mesmos sons do vento,

quando há vento para sentir e ouvir,

e a mesma algazarra dos pássaros que, parece,

não se cansam nunca de voar de lá para cá e de cá para lá,

e de cantar o que veem uns aos outros;

ainda assim, eu nunca sou o mesmo

em nenhum desses momentos, e nada do que está nestes

momentos meus é, também, o mesmo.

O meu passo de caminhar nunca tem o mesmo tamanho;

O calor do meu corpo, enquanto caminho, nunca é o mesmo

em nenhum trecho da minha caminhada;

As batidas do meu coração nunca são as mesmas em quantidade

e nem sempre tem a mesma intensidade,

mesma frequência, mesmo ritmo;

O sangue que corre pelas minhas veias nunca é o mesmo

sangue que corre num determinado trecho delas quando

eu passo pelo mesmo trecho de caminhar;

As minhas células nunca são as mesmas porque eu nunca respiro

o mesmo ar do mesmo jeito que respirei

num momento anterior;

É o tempo que passa e me leva, ou parte de mim, junto.

É o movimento do meu ser que me leva, ou parte de mim, junto.

Às vezes tenho a impressão de que, de tanto que não sou o mesmo enquanto vivo,

quando existo, todos os meus "eus" que já foram, juntam-se num só

e eu posso me enxergar diferente, como sou,

em cada um deles, nunca sendo o mesmo eu.