Herança

Que triste ver o homem de alma dobre,

um pé na rocha outro na areia movediça;

sentindo-se rico quando fica mais pobre,

pois, reputa liberdade o praticar injustiça...

Depois que a tardia ficha cai ele descobre,

que desconhece mais da metade da missa;

onde há lapsos, carências de sangue nobre,

supre o que falta, com sua veia enfermiça...

Prepara conto vazio pra eventual desdobre,

como se, verdade cedesse a essa dobradiça;

e mesmo que a boa intenção até lhe sobre,

não corre nem meia légua essa égua petiça...

Qual avestruz que, a própria cabeça encobre,

pensando haurir, certa proteção, nessa liça,

herda só insensatez todo o que assim obre,

que se dê a sua herança, segundo a justiça...