Urge (subir meio tom)

São letras

de grande sorte

estas

que a morte

prorrogou

Embora,

sonda mais

de perto

no campo aberto

das ruas

de passos

postergados

São escritos

medrosos

Emprestados

de uma sobrevida

cuja a brida

se perdeu

no terror pétreo

das imaginações

Em conjecturas

De ida certa,

mantida

São versos

de ausência

abstinência

e separação

De mão sem par,

pulmão sem ar,

de lar

que é chão

dos vermes

que roem

por fora

feito piranhas

vossas entranhas

que eram sãs

Hoje,

a carne de brancas

maçãs apodrecem

feito as nossas

pelas fossas

da terra

São liras

funestas

estas de arestas

duras

em frias flores

outonais

Por demais,

as sepulturas

guardam venturas

das gentes

d'outrora

Por ora,

a não presença,

desaparecença

abre a chaga

fantasmal

d'outros mundos

onde despertam

os combalidos

São palavras

de agora

que tão já

se dizem

antes

que os lábios

se tranquem,

descorem,

emudeçam

urge pois

e deveras

a fundação

do efêmero

ante ao inexato

emblema da vida

(Urge pois

e deveras

subir meio tom)

São dizeres

subnotificados,

de negligência

à ação protetora

do Estado

E daí?

Auxílio que

é esmola

e a demora

proposital

desdizem sobre

o intento

emergencial

Pobre vive em fila

Pobre morre em fila

A contagem oficial

mente o drama

de parentes

sem direito

a funeral

pelos cemitérios

São crônicas

de apocalipse

onde se vê,

notadamente,

o eclipse

que renega

o direito

à luz

aos iguais

Tais agonias

não transvertem,

tampouco

tocam os sujeitos

sobre a união

através

da distância

Um paradoxo

possível

e necessário

Oremos

(habemus religio)

São ladainhas

de Xangô

rezado baixo,

de esconder

a fé em gavetas

e abrir outras

que sejam

adequadas

Que não se

abra a de Tupã

ou melhor:

lacre!

Pegue o terço

de contas,

de prontas

respostas à dor

e dê com ele

de pregar

que o amor

não se escolhe,

põe-se goela

abaixo para

o bem (de quem?)

São, enfim,

impropérios

de fino arranjo

postos ao

escrutínio

de quem

interessar possa

O confinamento,

trancafiação

por dentro

das casas

e dos próprios

pensamentos

é lição

inescapável

a todos, mas

em particular

aos monstros

corporificados,

malfazejos

Desejo-lhes sorte

(ou não)

Felix Ventura
Enviado por Felix Ventura em 30/04/2020
Código do texto: T6933679
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