Musa,
minha Musa querida,
permita-me que te peça (não, implore)
que jamais me abandones
por estas sendas da vida
onde o Tédio se esconde
com suas mãos chumbentas
prontas para derrubar
o vôo raso do meu coração.
Tenho uma simples poltrona
num canto do meu quarto nu
para acolher tua presença,
tu que chegarás (assim espero)
com cuidados de mãe-ternura
para meu sono enfeitar.
Minha Musa companheira,
deixa-me ver-te em frente,
atrás, ao lado meu
nesta luta estradeira.
No arco daquela esquina,
afasta-me daquele oco
onde a Inveja se estira,
supina,
com seu olho de limo
e sua língua tão fina.
Ó, Musa-alvorecer
das minhas mais doces fantasias,
ensina-me a vislumbrar,
no amanhecer de cada dia,
o instante onde finda a dor,
onde o amor principia.
Naquele vale infértil,
livra-me do leito-lama
onde o Ódio em crostas se derrama
e num berço assaz estreito dorme
sonhando seu corpo assaz disforme.
Musa celeste,
consolatriz,
quando enfim chegar o cocheiro
com seus cavalos do mais negro verniz,
ajuda-me a embarcar sem saudades.
Mas deixa que fique meu verso,
seu pulso,
sua voz,
seu matiz.