Poema Filosófico

O desespero da morte no desespero da vida

Morrer e findar, sem rastro e sem continuidade.

Transformar-se em nulidade absoluta debaixo

Do escuro e fatal beco da cova, ah! Esse

Desespero é terrível, perante o desespero

De ser pobre e estar limitado pela pobreza

Ou ser rico e mesmo assim estar preso,

Perante as múltiplas formas de desespero

Da vida; é perante essa dura realidade

Que mentimos, acalentando risonhas esperanças,

Esperanças de ganhar na loteria, de ser amado

De encontrar a felicidade ou a glória dourada,

De cobrir-se de honras ou saciar-se de poder

Mais ai! Somos todos demasiadamente mesquinhos.

Queremos receber, mas raras vezes nos alegra dar

Vivemos regateando nossos dons orgulhosos

Como se fossemos bons demais para esse mundo

De borra, para esse mundo infeliz que não

Nos entende, não nos ama justamente, não

Oferece seus ouros e louros ao sagrado esforço.

Acalentamos esperanças que consolam, abrandando

O cerne do tempo que habitamos; não somos

Afinal bons demais para os outros, esses infernos?

São múltiplas as fomes insaciadas

Quem quisera conviver encontra o gelo

Quem quiser voar, o limite o fere

E há germes cruéis, miséria mais densa

Fomes mais cruentas, corações urrando

Lobos ferozes a devorar fetos de presas

Enquanto a maldade reclama o poderoso

Poucos são os que ousam saudar o dia

De coração puro e consciência acesa

E clamar: leva-me, rico caudal e harmonioso!

Antes queremos domar a indomável vida

Oh vida! Oh fera! Clamamos, tantas vezes

Fechados à partilha dos múltiplos dons.

Antes, que a vida nos leve e assome

Sua florescência por todos os recessos do ser.

Louvar generosa e ilimitadamente a vida

Em comunhão, perante o extenso flagelo

Da morte: eis o meu secreto desejo.