DESILUSÃO

Descobri que passaram cem anos

e eu sem saber que estava viva

Foi como perder o passado todo junto

com o futuro fecundado no seu ventre

agora com tudo ido, neva-me dentro

Dói saber que fui eu quem furou o céu

apartei as nuvens com as próprias mãos

rachei os raios de sol deteve o tempo

congelaram-se meus dedos e derreteram

desfeitos esmigalhados rotos partidos

Neva no interior em que sou passado

e tenho que desandar o futuro de dentro

voltar sosinha do lugar ao que fui acompanhada

Regresso ao presente do que partir foi miragem

agora com o meu passado velado

como uma fotografia antiga inalterável

Sem estrada volto para casa

Neva no meu passado: neva por mim adentro

Talvez ainda me nasça a palavra saudade...

Concha Rousia 23,9,13