SOLIDÃO

A entrada da casa estava suja.

Papéis, folhas, pedaços de qualquer coisa espalhados pelo chão.

Chão frio, indiferente; uma memória calada de tempos idos.

Passos lentos penetram o imóvel esquecido.

- Aqui foi um lugar tão bom!

Suspirou a pobre alma terrena que vaga pelas avenidas.

Sai à procura de sua outra parte o ser divino, porém, humano.

Humano solitário; uma solidão de carne e ossos;

Um mundo populoso, contudo, impessoal; cheio de faces estranhas.

De um pedaço de si esquecido em algum lugar está a caçar o viajante.

Um fantasma amigo que esboce um sorriso ou lhe dê um abraço.

Uma musa que lhe sirva de laço;

Uma inspiração para o amanhecer de outro dia.

Companhia!

Sentiu o Cristo na solidão da Cruz a ausência do Outro.

Seus amigos não o viram como Ele é.

Um carpinteiro despido de rei padecia a mais cruel de todas as solidões.

O homem tece a teia com os fios de suas escolhas!

O homem encastelou-se em seu castelo com medo da brisa gélida.

O homem é tão pequeno que não preenche seu próprio quarto.

Ele é tão efêmero que seus sonhos se transformam em bolhas de sabão.

Na terra há solidão!

Um vazio no peito dos homens nos diz que não há ninguém aqui.

As ruas estão cheias de números, de pessoas, de fantasias, de interesses, de sonhos e, sobretudo, de pesadelos.

- Teu inimigo é o outro que te espreita a cada esquina!

- Teu algoz são os homens, teus irmãos, teus primos e primas!

- Ah, se a humanidade cresse que no madeiro do Calvário estava um santo carpinteiro!

- Dizem que Ele nos prometeu companhia:

“Estarei convosco todos os dias de vossas vidas”.

De Jerusalém ouvi o grito: “Pai, por que me abandonastes?”

Em Nazaré, seus irmãos não o conheceram.

Seu sangue está nas mãos de Pilatos, de Caifás, e de toda a corte sagrada.

E o mundo é o mesmo mundo;

O de Paulo, o de Maria, o de João, o de Tadeu, o de Clementes, o de Dona Raimunda do Acarajé, até de Edmundo que deixou de viver por causa da mulher.

Na entrada da casa havia uma sombra.

Uma silhueta de gente.

Uma alma suplicante.

Um coração carente.

Um perdido viajante.

Um velho, amigo de uma velha que teve fé.

Um marido sem companheira.

Dois irmãos que vivem sozinhos sem afagos.

A noite veio; as luzes da cidade acenderam.

As sombras sumiram...

Roosevelt leite
Enviado por Roosevelt leite em 18/09/2014
Reeditado em 24/09/2015
Código do texto: T4966289
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