Ode à solidão

Encontrei você cochilando dentro

De meu peito. Nunca me meti em peito

De ninguém. Que liberdades são essas?

Nunca me esquecerei desse acontecimento

na vida de minhas retinas tão fatigadas.

Nunca me esquecerei que dentro

de meu peito tinha você.

Se tu me amas, ama-me em silêncio

Não o grites de cima dos telhados

Deixa em paz os passarinhos

Deixa em paz a mim!

Pois quando tu falas, parece

Que a voz da brisa se cala

Não se ponha na torre a sonhar

Nem queiras as estrelas do céu

Pois só quem ama pode ter ouvido

Capaz de ouvir e de entender estrelas

Se uma

Palavra

Escrita é uma

Palavra não dita

Então vivo em silêncio

Apenas ao seu lado

Mas ainda não me acostumei com o seu corpo, com a sua cara

Você é engraçada! Você parece louca

Amou João, amou Teresa,

Amou Raimundo, amou Maria,

Amou Joaquim, não amou Lili,

Mas ama a mim

Que não tinha entrado na história

E eu desconfiava:

Todos os sonetos, gazéis, virelais, sextinas e rondós são iguais

E todos, todos

Os poemas em verso livre são enfadonhamente iguais

Assim como

Todos os amores, iguais iguais iguais

Vou-me embora pra Pasárgada

Lá sou amigo do rei

Lá tenho a mulher que eu quero

Na cama que escolherei

Em Pasárgada tem tudo

Menos a sua presença

Tem prostitutas bonitas

Para a gente namorar

Vá embora, vá, retira

As algemas dos meus braços.

Vivo perto de ti, mas que me importa?

Se eu já não vivo em mim! Ando a vaguear

Projeto-me por espaços

Cheios da tua figura

E quando de noite você vem pálida...

São beijos que queimam... e as noites deliram,

e digo “Adeus, meus sonhos”, e pranteio e morro!

E minh'alma na treva agora dorme

Que me resta, meu Deus?

Sinto Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos

Eu não tinha este rosto de hoje,

assim calmo, assim triste, assim magro,

nem estes olhos tão vazios,

nem o lábio amargo.

Sinto a vida inteira que podia ter sido e que não foi

Mas como seremos sempre um

A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.