o meu quarto fede
o meu quarto fede
e não adianta abrir as janelas
deixar o ar e o sol entrarem
não adianta limpar a estante de quadrinhos
empestá-lo inteiramente com desinfetante coala
por que o meu quarto fede
e ponto
e mesmo que'u tirasse a cama
o guarda roupas os livros e o ventilador
nada mudaria esse cheiro sufocante
pois a mistura de roupa suja do mês passado
com toalha molhada suor e gala
tá empregnada nas paredes nas janelas
na porta e em todo chão
meu quarto fede
e ponto
várias vezes fui abandonado pela mulher de cabelos pretos
com sinal próximo ao peito que cavalgara por longos anos junto a mim
na cama de molas barulhenta
na última partida alegou que o fedor não vinha da cama
não vinha do chão não vinha da foda
não vinha do quarto
tudo que dalí exalava vinha de meus poros
os quais escorriam suor e uma angústia melancólica
da qual não podia suportar
hoje vivo de cheirar o mundo
percorrer as ruas os bares os puteiros
os cangotes e estádios de futebol
que sempre me são agradáveis ao olfato
mas toda vez que volto pra casa
toda vez que entro no quarto
me obrigo a cheirar mais uma vez a calcinha bege com laço
esquecida no fundo da bolsa
pois por mais que o fedor do quarto seja insuportável
o cheiro de saudade faz essa porra toda
parecer nada
depois de um chifre
o mundo inteiro cheira a sabão em pó