No dia que minha tia preferida morreu de velhice
no dia que minha tia preferida morreu de velhice
eu te vi sentada no banco da upa
consolando a minha mãe que se culpara por não-sei-o-quê
e o meu coração desacelerou
eu tava era dilacerado por dentro
como se a partida tivesse me puxado o intestino delgado pelo cu
a sete palmos do chão
mas saber que você tava ali
me acalmava o peito feito soltinho de seu ribeiro
bolado com página da gênese por falta de seda
e foi nesse dia qu’eu segurei o choro até na hora de reconhecer
o irreconhecível corpo inchado e esbranquiçado
coberto até o rosto por um lençol branco com a marca do hospital
mesmo sabendo que ter adiado a visita na uti para o dia seguinte
me fez perder a última chance de tirar onda com a véia
“me espera pra gente ir junto amanhã a noite” lembra?
foi só então que eu percebi que amor e morte são tênues
linhas que costuram um universo rasgado
que transpassa esse oceano turbulento que é viver ou morrer
amor e morte são inevitáveis
te atropelam quando decidem chegar
feito caminhoneiro dando ré sem olhar retrovisor
não pedem licença
só te esmagam e fogem sem prestar socorro