Verter
Nasceu uma menina que não queria
Do útero sair
Ficou como semente que não iria florir
Passou do tempo
E foi arrancada a força
Quase morre de reclusa ali ficar
Mas atravessou o rio de sangue
Que se pós a verter
Cruzou o túnel
Para a vida renascer
Desafiou a medicina
A morte
A vida
As limitações visuais
De ver e de se ver
Palavras truncadas
Números misturados
Decisões emboladas
Neste novelo de emoções
Transplantes de órgãos
Vulnerabilidades motoras
Quedas
E levantes
De bicicleta
Ou na caminhada
Pedras haviam
Há
E haverá
Mas todas servirão
Na sua edificação
Filha, mulher, mãe, educadora
Em batalhas constantes
Cansada por vezes
Exaurida outras tantas
Mas desistir não é uma opção
Pra quem traz a teimosia como marca
De vida e determinação
Não dá o braço a torcer
E por mais difícil que seja
Os desafios em casa amanhecer
Tem espírito de luta em seu sangue
E sabe que irá vencer
Está sou eu
Um misto de tudo que foi
Que é
E ainda será
Qual rio que segue seu curso
Nos ponteiros dos dias
A percorrer e andar
Ana Lu Portes, 14 de outubro, 2023