História de asfalto

Da janela alta,

vejo os riscos em vermelho e branco

dos carros que se consomem nas marginais:

horário cheio, horário ininterrupto,

são tantos os movimentos que se confundem.

O cheiro de borracha queimada invade as pistas.

Sirenes estardalhaçam os ferimentos

de caminhões, de ônibus,

que se acavalam entre o meio-fio e os mortais.

Não há lugar para o silêncio,

não há costume de se ouvir:

há sim o frenesi alucinante dos dias velozes

a se chocarem com vidas desvividas.

Do baixo piso é difícil perceber que,

ao longe, a fumaça está derretendo as emoções.

Ninguém se comove com o vendedor ambulante

no meio do tráfego, em seu último recurso de sobrevivência.

(Entre os intervalos dos engarrafamentos,

um suco gelado, um amendoim torrado...

quem sabe uma pipoca doce com sabor caramelo.)

A vida assim se reveza em seu itinerário flexível:

dias de chuva, dias de sol, dias de vento.

A temperatura está na face de cada indivíduo

a se deslocar com pouco ou nenhum interesse

pelas alterações passadas uns aos outros.

São Paulo, 25 de setembro de 2009.

Marcela de Baumont
Enviado por Marcela de Baumont em 25/09/2009
Código do texto: T1831694
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