O saxofonista no sinal de trânsito
Havia quem achasse chique. “Ah, dá um ar de Nova Yorque a isso aqui”
Havia quem desse chilique. “Ô, moço, tira essas bolsas da calçada, quero passar!”
Havia quem o achasse um louco. “Olha o cabelo, e as calças!”
Havia quem achasse pouco. “Devia ir tocar lá em Brasília”
Ele estava lá, no vai não vai. E eu, por um minuto, quis tomar-lhe o sax.
Não sei nem fazer o lá. Mas e daí? Ele o que queria era transgredir.
Fosse tocar “O que é? O que é?” chamaria mais atenção do que notas soltas?
Não era a música que chamava atenção. Era a cara-de-pau.
Cara-de-pau sadia. Sem a qual o mundo não roda.
Ousadia que faz a vida ter (algum) sentido.
“Não faz mal. Te avia” Há de ter pensado ele.
“Eu também queria.” Pensei eu ao vê-lo parado.
Os passantes? Assobios de indiferença. “Ainda bem que não é comigo”
Os viajantes? Pena. “Não teve outras oportunidades, senão não estava aí.”
Hesitante. “O sinal já vai abrir, toco não toco?”
Num instante. Já não mais o vejo. O ônibus seguiu seu curso.