PRETO NO BRANCO (Dia da consciência negra?)
Era preto o Rei da Bola
Assim como o Cartola,
Clementina de Jesus.
Nenhum entrou de sola
E carregaram sua cruz
Espalhando muita luz
Melhores que a escola
Ensinaram a seu jeito
Sem rancor quilombola
Cada um mais que perfeito
Não falaram de Angola
De injustiça, preconceito
Os reais donos da terra
Índios que aqui estavam
Feitos de gato e sapato
Mortos os que lutavam
Fugiram para a serra
Esconderam-se no mato
Meu avô, um carcamano
Braço dado uma gestante
Mão de obra bem barata
Se na pele sem chibata
Dentro do caucasiano
O sofrer bateu bastante
Embora não acorrentados
Mas também ludibriados
Estranhas caras amarelas
Atravessaram oceanos
Em sonhos traziam planos
A este país de mazelas
Meu caro, não se engane!
Cuidado com a direção do tiro
Que fazer sem toda essa gente?
Sem o macarrão do Giovanni
A granja e horta do Oshiro,
O portuga e seu pão quente?
Igual sangue no coração
Tantas raças em união
Formaram esta aquarela.
De suas seculares dores
Geraram imensos amores
Na rua, na praça, na favela
Torçam-me mil narizes
Ou aponte-me seu dedo!
Mensagem aos aprendizes:
Todos tiveram seu medo
Flagelos, dores, cicatrizes
Pelos tempos de degredo
Pra que ranços ancestrais
Futucando antigas feridas?
Dores diversas rangidas.
Preciso, sim, que se revele:
Nas senzalas, muito mais!
Não se engana quem é sábio
Diferença não é o tipo do lábio
Desnude-se além da pele
Há velhos, jovens, meninas
Estendidos num papelão
Esmolando nas esquinas
Pobreza de todo jeito
Rastejando pelo chão
Morrendo sem ter leito
Com o perdão a Solano
De toda cor e sem nome
Negro, branco, cigano
Tem gente com fome