Na Preeça

Na praça.

A graça

de um fim de tarde ensolarada.

O frenesi de pessoas,

formigueiro humano a se locomover afobado.

O acelerar dos automóveis,

speed fire na largada do farol.

O rosnar dos ônibus,

enlatado de gentes que retornam.

Tudo se move em busca...

De uma moeda, o pedinte já conhecido no cruzamento da Rio Branco com a Duque de Caxias.

Do retorno ao lar, descanso, o homem após um dia de trabalho, suor mal pago.

Da casa, cozinha, mulher-mãe, esposa desgastada durante o dia em um trabalho pouco vantajoso, e nada lhe resta para a noite.

Da televisão, lazer barato, a mocinha que não pôde estudar e a novela é o assunto para o dia seguinte, na fábrica ou balcão.

Da escola, esperança de sucesso, emprego melhor, o jovem que divide seu salário entre o pagamento do curso e a comida.

Da sobrevivência, a prostituta que mercadeja seu corpo em reforço ao baixo salário de doméstica.

Do encontrão, o trombadinha que arranca do braço um pulseira tão falsa quanto sua própria vida.

Do sonho, o bicha louca, peruca, vestido de mulher, de rebolar exagerado e barba já despontada depois de horas após raspá-la.

Da borboleta, o negrinho filho da vendedora de milho verde, tão verde quanto sua vida ainda criança de futuro amargo e imprevisto.

Do horizonte, o sol que se esconde da Princesa Isabel deixando a Duque de Caxias mais escura ainda do que a poluição já a deixou.

Do nada, no escuro das árvores o molambo, resto de gente que até o calor de vida abandonou, no aconchego da bebida.

Na torre do coração de Jesus, os sinos dobram as Ave-Marias...

Som que se esvai abafado na poluição sem atingir a batucada no coreto da Princesa Isabel.

O ranger das lojas velhas de automóveis velhos não conseguem abafar aquela batucada.

Deus e Homem...

Homens de um Deus...

Coreto de praça...

Sarau e Recital...

Batucada.

Batucada em bumbos de latas vazias,

Batucada em pandeiros de tampinhas de garrafas,

Batucada em reco-reco de garrafas de plástico para água,

Batucada em chocalho de latinha de cerveja vazia, com pedrinhas,

Batucada em ferrinhos a estrepitar sons que enganam o viver.

Batucada da não vida.

Coreto de praça...

Refúgio de boêmios...

Refúgio de farrapos humanos...

Abrigo para molambos que se agasalham na cachaça,

Abrigo para nordestinos que chegam em busca de uma vida que aqui não existe,

Abrigo para despejado, que após perder o emprego perde onde morar,

Abrigo para pedinte que aguarda o dia amanhecer para esmolar,

Abrigo para a menininha, trombadinha-prostituta, pelo fumo ou cachaça.

ABRIGO para de não vidas.

Coreto de praça...

Encontro de casais...

Encontro de não viventes.

Silêncio.

Escuro...

A noite envolve a Princesa Isabel com seu manto negro escondendo sua vergonha.

Num ato de compaixão tudo dorme... dormem um sono sonhado de um amanhecer melhor.

Diz boa noite...

Presta a devida continência ao sentinela.

Em seu silêncio caminho em busca de si mesmo...

Não há o que encontrar...

Apenas caminha.

(o original foi escrito em 1.982 e revisto em 22.05.2 012, por quatro anos trabalhei no 1º. BPFM – hoje Policia Ambiental – com o comando na Av. Rio Branco, junto a Princesa Izabel e o Coração de Jezus)

Carlos Gritti
Enviado por Carlos Gritti em 22/05/2012
Código do texto: T3681672