O FADO DA DESGRAÇADINHA...


O Autor em 1975 - Retornado de Angola

 Andava a desgraçadinha no gamanso,
P'ra alimentar os dois filhos tuberculosos...
 E na calada da noite achava sempre um "tanso" 
Que lhe enchia os dois rebentos bem gulosos!
 

Ia de porta em porta a pedinchar,
Pelo amor da sua Mãezinha dê-me a esmola
 Que me ajude a viver este meu penar,
Porque os coitados já nem podem ir à escola!

 Ai Jesus, pobre mulher valha-me Deus,
 Vá pedir a outra porta na vizinhança
Porque eu, olhe... até p'ros meus!...
 Já nem sei o que fazer p'ra lhes encher a pança!

 Ah pois é!... ladeira abaixo lá ia ela,
 Porta sim e porta não a desandar!...
 Á noitinha ela punha-se à janela,
A ver a Lua que lhe dava o seu Luar!

De graça em graça à luz do dia,
A pobre mulher assim viva e altiva era
A primeira a colher o que comia,
E a fingir que a vida é assim tão "bera" ...

 Definhava a olhos vistos, só por fora!
 Porque a Alma de cigana lhe traía,
De tanto pedir a Deus, ELE foi-se embora,
Pois já nem o Jesus Cristo nela cria!

(In: Poesias Soltas - Anos "Oi Tenta"... tenta aí a ver se pega!)

* VERBETES DA GÍRIA ALFACINHA: "GAMANSO" = Ladroagem; "BERA" = Ruim; "CRIA" = uma forma do verbo Crer ou filhote de animal em tenra idade. 
 Autor: Silvino Potêncio - Emigrante Transmontano em Natal/Brasil.
 
Silvino Potêncio
Enviado por Silvino Potêncio em 27/10/2012
Reeditado em 16/12/2019
Código do texto: T3955025
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