Outra morte.

Quando o vejo fico calado

Não sou guardião desse não-amado

Mas seus negros olhos olham pra mim

Não enxergo nada só enxergo o Fim

Toda a raiva encontra toda a indiferença

A ponta da faca não há fé que vença

Vida aquela ela nunca quis

Mas a criança com sua lâmina diz:

“Não há neste mundo alguém que me ame

Desde sempre tive esta fome

Se olham pra mim não vêem bicho nem gente

Deus cruel que me fez transparente”

À medida que a carne é rasgada

Mais um pouco a cidade é turvada

Na minha tripa cortada

Ilusão de vida rasgada

Não mais paciência têm os excluídos

Todos seus clamores não ouvidos

Caminhamos para a grande vala

Esta é a tal sociedade de que se fala

Destroem-se pontes destroem-se estradas

Ambas as vidas ceifadas

A criança que vira fera

E eu, que tenho a morte à espera

Enquanto caminho a ser outro morto

Fico em meus pensamentos ensangüentados absorto

O homem de branco decreta morte clínica

Sou agora estatística cínica

Mais um delito mais outro assalto

Virei apenas mancha seca no asfalto.