O chão é de barro e os pés descalços

Na favela, o chão é de barro

A casa de madeira, ou talvez de papelão

É estranho que você não saiba,

Pois sabe tudo do Sudão.

Te interessa a fome da África e até

A guerra do Afeganistão,

Mas não sabe que ali do lado não é todo mundo que tem pão.

Você tem medo da violência,

E até pensa em ter uma arma,

Diz que enquanto o bandido está solto

É você quem está na prisão.

Mas meu caro não se faça de louco

O bandido nem sempre é o João,

Tem um monte de cabra solto

Condenando meu irmão

Insistem que a felicidade é questão de consciência

Mas não sabem que fome não faz parte dessa ciência.

Não despreze o filho do outro só por que não entra em seu carro

O sangue que corre nas veias dele, é tão vermelho quanto o seu.

Quando quiseres oferecer essa pílula de faz de conta da felicidade

De ajuda, que só ajuda a sua falta de bondade,

Lembre-se que felicidade não se vende em caixinha de fósforo,

Que não dá para acender e quando apagar é só riscar o próximo.

Que quando risca um filho da terra na nossa frente,

Risca nosso nome. É gente!

Quando risca o preto, o pobre da favela, a travesti,

Risca uma alma, um ser, um humano.

Não, não dá para sorrir, sonhar e ser feliz então

Não tente nos entalar com a sua ideologia,

Por que essa utopia não serve para velar nossos sonhos.

Na favela o chão é de barro e o pé é descalço.