OLHARES

Olhamos de lado

e nos olha o outro,

mudo, num mundo surdo,

a nos espreitar

como se um espelho fosse

a representar, talvez,

uma outra parte do que somos.

E profundamente

vasculhamos o outro lado do outro,

a nos procurar.

E olhares outros repartimos na escuridão

pra clarear a multiplicidade de sentidos

no que olhamos.

Olhares que são grãos de areia

no infinito da procura.

Mar de buscas nestes prantos.

Acalantos pro sonhar

que no horizonte perde-se entre encantos

sem ter cura.

E para nos encontrar do outro lado

do que imaginamos que vemos neste vai e vem,

olhamos desesperançados do outro lado da rua

como o prisioneiro que transcende

para a liberdade que não tem.

E do outro lado o outro nos olha de lado,

disfarçando o sentimento como lhe convém,

procurando nos olhares que se perdem

o mesmo intrigante achado

que o outro procura também.

Do livro DO OUTRO LADO DO OUTRO