DE CABEÇA PARA BAIXO
DE CABEÇA PARA BAIXO
Na mangueira do jardim
ouvindo atentamente
o mundo ao derredor
morcegos pensam o mundo...
À noite catam os frutos
que abundam nas cercanias:
amêndoas, jambos, castanhas,
carambolas joviais,
talvez ouçam estampidos,
silvos, gritos, exclamações
que vão decodificando
conforme a ocasião:
Serão fogos de artífício,
ou a eterna festa junina
que a violência inventou?
De manhã, céleres voltam
aos galhos mais ensombrados
e ficam a filosofar,
em grupos dependurados
todo dia, o dia todo...
Nada vêem – são "ratos cegos" – (1)
mas eis como imaginam
a vida humana a passar
em sua tela interior:
Pais alegres trabalhando,
os filhos em boas escolas
onde lhes plantam sementes
de saudável educação...
Doentes têm assistência,
há respeito, cortesia, transporte,
compreensão, saúde e cidadania...
Ninguém é melhor que o outro,
sequer há rico ou pobre,
tudo está muito bonito,
cada coisa em seu lugar!...
(" What a wonderful world!" (2)
diriam seus irmãos do norte...)
– Mas este ideal de perfeição,
utopias sonhadas por mentes e corações,
é possível, meu irmão?
– Amigo, isto ignoro!
Só sei é que este é o avesso mundo
que os morcegos devem "ver"
em sua diurna meditação,
já que estão dependurados,
DE CABEÇA PARA BAIXO!...
= 0 =
(1) Morcego (etm.) = mur(rato)+cecu(cego)
(2) "Que mundo maravilhoso! "